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domingo, 17 de maio de 2009

"Travessia do Sul" - Dia 4

" Travessia do Sul "
Um aventura em solitário por trilhos e caminhos do sul de Portugal.

17 De Maio 2009
Aljezur – Sagres


A última e mais aguardada tirada do meu passeio começou cedo. Depois de paga a despesa da estadia na tarde anterior, à saída dos portões do parque o relógio marcava as 08h05.

Os primeiros quilómetros foram pachorrentos, de ritmo calmo e compassado até à grande descida, que fiz tranquilamente agarrado aos travões, empurrado pelos quase 20kg de peso da minha menina.
Á semelhança do dia anterior rumei ao Castelo, trepando toda aquela empinada rua de empedrado, passando novamente pela igreja e seguindo adiante, parando ofegante a 20m do final, já completamente encharcado em suor, ardendo de calor.


Castelo de Aljezur ao longe…

Aqui já mais perto, mas comigo já apeado…

As vistas que tinha agora sobre Aldeia Nova…

Por uns estradões rápidos fui ganhando quilómetros e ritmo. O dia, à semelhança de todos os outros brindava-me a manha com um esplêndido céu azul, polvilhado de vez em quando com pequenos farrapos de algodão branco…
A mesma brisa, fiel, que me acompanhava há dias, continuava arrefecendo e mantendo dócil o quente dia.


Pelas 09h30 já cheirava a Algarve…

A determinada altura e depois de uma pequena elevação surgem magnificas as linhas de espuma brancas a recortar a acidentada costa contra uma paisagem de azul a perder no horizonte.


Na chegada à costa e ao mar…

Toda uma paisagem sublime...

À medida que me ia aproximando da costa o terreno ia ficando com desníveis cada vez mais acentuados.
Por várias vezes durante o dia me veria a descer à cota 0 para depois voltar a conquistar muitos metros verticais às paragens daquela zona… Um sobe e desce constante que já não seria fácil numa jornada de btt sem peso excessivo na traseira, junto com umas pastilhas do travão traseiro, essas sim, a roçar a exaustão…

No entanto todo um mundo novo se ia mostrando espectacular, abafando as dores nas pernas que já pontuavam cada pedalada fora da cadência. A minha mente viajava mais depressa que as minhas cansadas pernas, deitando-se a adivinhar as paisagens e os trilhos que se seguiriam, mas sempre perdendo no que toca a originalidade das cores e formas, no que toca aos caprichosos cheiros e sons, no que refere às sensações que pode proporcionar a alguém que assim o deseje, que assim o anseie.


Zonas completamente desabitadas…

Vales de beleza discreta…

Não foi rápida a chegada à Carrapateira, mas foi soberba a curta viagem. Tinha valido cada minuto das duas horas de pedal que já trazia quando pelas 10h05 entrei na vila da Carrapateira, onde contava tomar o café da manha, coisa que pela hora matutina e percurso escolhido não me tinha sido possível tomar ainda. Além de que vinha a contar com um café na entrada da vila que também se encontrava fechado.

A praia da Carrapateira providenciou das melhores vistas, daquelas que nos fazem perder o sentido do tempo e nos carregam embalados pela beleza e singularidade do momento.
Calmamente, aproveitando cada segundo de deleite, vou subindo o pequeno troço alcatroado que me eleva acima do ombro norte da praia. Uma enorme duna de areia cortada por uma estreita tira cinzenta, escaldante sob o sol que subia ligeiro no céu azul.
A paisagem era sublime.
O mar reflectia um azul intenso, escuro. Rebelde. Debatia-se na orla costeira com evidente fulgor, para evidente gosto dos surfistas que nas suas ondas desenhavam leques de água e se deixavam apanhar por elas para depois, muito rápidos, lhes escapar acelerando, para logo depois executarem novo leque de água à saída do tubo e assim sucessivamente até esta perder força ou o surfista perder o jogo e cair da sua prancha. Onde todos naturalmente se voltavam a agarrar para de novo tentarem a sua sorte, independente do sucesso ou fracasso anterior. Está à vista de todos que o que interessa mesmo no final não é ganhar ou perder, mas sim as vivências que vamos tirando desse caminho que se percorre. Os surfistas nas suas ondas como todos nós na vida… Só não vê quem não quer.


Á entrada da vila da Carrapateira…

Uma subidinha que pouco ou nada custou devido às compensadoras vistas…

Carrapateira…

Mais do mesmo. Um lindo dia, com uma bela paisagem…

Pelas narinas entrava-me um cheiro inebriante a mar, a sal. Àquela maresia tão própria das costas violentas, inóspitas, que fica no ar depois das ondas se debaterem contra as escarpadas falésias, investida após investida, selvagens.
Depois de uma curva no caminho a natureza volta a suplantar a minha poderosa imaginação, situação aliás habitual mas que me agrada enormemente.
Toda ela uma bênção para os olhos.
Desde a zona dos viveiros, ou costa dos percebes, ali à beirinha daquele enorme azul que se extinguia apenas onde a vista alcançava, estava uma linha de costa que teria que contornar. Este pedaço de percurso deixou-me bêbado com tanta luz, com tanto para ver, daquelas vistas iguais aos postais pirosos que vemos à venda para turistas, deixando-me num estado de espírito que muito dificilmente encontraria palavras que o conseguissem descrever de forma conveniente e fiel.


Uma curva no caminho…

Reservava estas vistas para sul…
Uma costa fabulosa…

Cheia de pequenas pérolas…

A praia do Amado, onde bebi o tão ansiado café numa roulotte que por lá estava estacionada, surgiu tranquilamente no final de uma curta descida. Até um geladinho comi aqui enquanto fazia um breve descanso… Voltei a carregar de água, mais 1,5l. Desde as 08h00 da manhã já tinha bebido mais de um litro de água. Sim porque a garrafa entrou inteira para dentro do CamelBak, não sobrando uma gota no recipiente original uma vez finalizado o processo.
Faltavam quinze minutos para as onze da manha quando me pus de novo ao caminho. Ainda não o sabia mas estaria prestes e enfrentar os mais duros quilómetros de toda a jornada e refiro-me à jornada completa.
Em parte alguma do percurso tinha tido que me aprumar tanto em cima da burra, mesmo quando a empurrava e puxava, ou me via quase a perder-lhe o controlo, como aconteceu algumas vezes antes. As dificuldades que se seguiram foram as mais sérias. Embora algumas me tenham feito sentar o rabo no chão a rir sozinho depois de ultrapassadas, outras houve que me deixaram pequenino, pequenino, durante os minutos seguintes. Outras, verdadeiro mel para os sentidos.
E tudo isto num só dia de existência. Não havia eu de ficar moído no final…

Só que disto eu nada sabia ainda.
Destas dificuldades eu tinha somente uma vaga ideia, remota, de relatos lidos na internet, de algumas fotografias que circulam nesse universo paralelo ao nosso.
Haveria de me confrontar com elas, uma de cada vez, há medida que se me iam mostrando. E é tão boa esta sensação da aventura, do mistério, da adrenalina a correr forte nas veias, dos músculos vibrantes, de sentir o espírito vivo e alma aberta ao mundo, verdadeiramente juntos num só…
Da liberdade completa e total.


Na praia do Amado, à espera do cafezinho…

Dois minutos depois de sair daqui estava num mundo distante. Num mundo de trilhos alucinantes e vertiginosos, suspensos nas falésias a largos metros da fina areia da praia. Trilhos pedestres pendurados em encostas demasiado inclinadas para permitirem sequer um erro, uma desatenção. Com inclinações tais que me cheguei a ver obrigado a ir a pé porque o crank esquerdo batia na pendente de terra empurrando-me para fora, para a direita e para o vazio. Não foi mais fácil ir a pé mas foi definitivamente mais seguro, já que assim se algo caísse seria só a minha menina, ao contrário do que aconteceria na primeira hipótese. No entanto antes da curva que desaparecia no topo da falésia já esmagava novamente os pedais…

Trilhos na praia do Amado…

Tomei o café ali em cima…

Depois de sair das areias. Visível o trilho que corta diagonalmente a encosta…

Do melhor…

Lindo, lindo, lindo! Mas estranhamente assustador…

Depois de ultrapassada a parte mais inclinada voltei a segurar a guiador entre as mãos, mas desta feita de rabo sentado no selim e apenas voltei a desmontar porque ainda mantenho aquele espírito de auto-preservação, natural a todos os seres vivos, e que felizmente me mantém capaz de ajuizar correctamente algumas situações, embora nem todas deva admitir.
O trilho corria sinuoso bem no topo da falésia. Exposto.
Noto num relance que a minha passagem naquele ermo caminho não tinha sido noticiada por ninguém das poucas pessoas que se passeavam na beira da areia molhada.
Durante aquele espaço de tempo, o mundo pareceu realmente parar. Já havia experimentado esta sensação antes, na montanha, em situações de compromisso semelhantes. Aliás foi como encarei o obstáculo, como uma passagem mais técnica de montanha, que teria que vencer sem outro desfecho possível.
De repente só ouvimos o nosso coração, o nosso suor enquanto nos molha a fronte e nos diz: “Tu consegues!”.
Tudo à volta se imobiliza num suspiro de silêncio enquanto nós tomamos as acções que temos que tomar, sem raciocinar em demasia, deixando pouca margem de manobra ao cérebro para nos baralhar os instintos, para nos confundir com dúvidas e incertezas.
De músculos tensos, com todos os sentidos alerta, e depois de encher de ar o peito duas vezes, como quem ganha coragem, enfrento então esse pequeno pedacito de caminho, mas que pelas condições que apresentava reunia tudo para me fazer satisfazer as minhas mais básicas necessidades.


Para mim a parte mais complicada devido ao estado do trilho, parcialmente destruído, e que me obrigou novamente a desmontar…

A uma altura pouco aconselhada a um deslize é melhor não facilitar…

Vistas de arrepiar...

E para compensar do esforço lá estavam sempre as preciosas vistas…

A subir muitos metros seguidos desde a cota 0 novamente…

Entretanto, as cores e cheiros do mundo que me rodeavam eram, por si só, capazes de me fazer esquecer a dureza dos quilómetros que ia acumulando nas perninhas. Felizmente que o piso se mantinha capaz de boas médias, permitia rolar mais ou menos rápido, consoante o motor deste binómio assim o conseguia.

De qualquer forma, os trilhos não eram só caminhos fáceis. Esta foi a jornada que mais me obrigou a navegar atento ao GPS, obrigando-me muitas vezes a perscrutar o caminho a pé, antes de me fazer a ele, principalmente quando não lhe via o final, ou como em algumas partes houve, que por metros o trilho desaparecia para ir surgir mais à frente perdido no mato rasteiro de mil e uma cores.
Parava, desmontava, ia ver do caminho. Voltava atrás, pegava na bicicleta e lá me fazia ao caminho, como e por onde podia.
Assim foi acontecendo até determinada altura em que me surge pela frente uma descida que dificilmente esquecerei tão cedo.
Fiquei parado no topo alguns minutos, no “vai-não-vai”, tentando analisar se tinha capacidades de o fazer montado, em segurança.
Não tenho por hábito desmontar em descidas, mas esta assim o obrigou, e em boa hora tomei tal opção. O que se passou a seguir foi, sem margem para dúvidas, o momento mais cómico de toda a odisseia. A estar alguém a ver e por certo que, por esta hora, ainda se estaria a rir.
Eu também me ri, mas apenas no final. Depois de ter feito mais de metade da descida arrastado pela bike, segurando como podia no selim só com uma mão enquanto a outra barafustava em círculos no ar, desesperadamente tentando manter o equilíbrio do restante corpo, ao mesmo tempo que de pés a arrastar pelo pedregoso chão, fui fazendo ski, em completo pânico, com a situação completamente fora de controlo até que a frente da bike bate numa pedra, torce toda para a esquerda e me joga a bike para as couves, permitindo desta forma imobilizar o comboio que descia louco ravina abaixo. Eu segui mais um metro ou dois, agora já sem o apoio da bike, de ski, acabando por ficar sentado no chão, de rabo flamejante de dor. Foi de costas para a descida, com a bike tombada sobre o flanco, imóvel e já na base daquela demoníaca parede que me deixe estar sentado por um pedaço, enquanto fumava um cigarro e comia mais um mini-chocolate.

Depois disto pouco havia que me poderia impedir de chegar a Sagres. Cheguei a dizer em alto e bom som, que nem que partisse um crank, haveria de arrastar a bicicleta até às quentes e finas areias do meu destino final.

Uma descida de loucos…

A fotografia da parede ainda a massajar o rabo nas pedras…

O caminho que ia ficando para trás. Sagres cada vez mais perto…

O tempo ia passando fugidio, enquanto eu me divertia neste sobe e desce constante. De subidas longas e morosas a descidas curtas e técnicas mas sempre com vistas de encher as medidas a qualquer um. Sentia-me privilegiado por poder ter este pequeno tempo de qualidade só para mim, de poder usufruir dele inteiro. Sem meio-termo, um acto perfeito de egoísmo, que não me importa de admitir visto que preciso dele como pão para a boca, como ar!
Sou um ser sociável, mas esta solidão desejada, esta tranquilidade permite-me pensar, permite-me ouvir os desejos mais íntimos do meu coração no que refere à minha pessoa, e é tão imprescindível para mim que chega a doer fisicamente.
As minhas vontades, os meus desejos, as minhas reais necessidades e não aquelas que me são impostas por uma sociedade hostil, consumista e influenciadora, chegam-me de uma forma mais clara, transparente muitas vezes.
A natureza consegue ser o catalisador, o portal de acesso ao meu eu… É quem me permite a entrada nos mais recônditos e escondidos lugares da minha consciência, sempre me ensinando quem sou, como sou, do que sou feito e do que é preciso para levar de vencido este esqueleto.
Desde há muitos anos que a natureza tem sido a minha melhor professora e hoje estava a ser mais um dia na escola. Um dia de exames, para ser mais preciso.

A hora do almoço aproximava-se veloz e foi num pinhal, recheado de belas e convidativas sombras, que devorei o que me restava de comida. Um mini-chocolate para abrir o apetite, uma “powerbar” de “banana flavour” horrível e que mesmo com fome só consegui trincar metade, terminando em beleza com mais um chocolate e os restantes amendoins que vinha petiscando desde a roulotte na praia do Amado, onde os comprei.
Sentia já nas narinas o vago cheiro da conquista final e apesar de até ali as coisas terem corrido pelo melhor, temia ainda pelo material que já apresentava alguns sinais de desgaste.
O suporte traseiro continuava hirto e firme. Já tinha cedido tudo o que tinha para ceder e já há uns quilómetros que deixara de me preocupar de cada vez que o ouvia roçar na roda.
Preocupava-me agora mais o facto das minhas pastilhas traseiras há muito terem pedido reforma. Estavam nas lonas e certamente não aguentariam até final.
As pastilhas da frente estavam pelo mesmo caminho. Embora mais frescas estavam agora a ser muito mais solicitadas desde que me apercebera do gasto anormal que as de trás vinham a sofrer. O peso extra e o contínuo uso dos travões em todas as descidas vinha-se a mostrar caro, mas não haveria outra forma. A segurança sempre esteve no topo das prioridades.

“Devia ter-me lembrado deste pormenor antes e ter trazido um par extra.” – Lembro-me de pensar.

Mas agora já nada havia a fazer e a par com mais uns quantos barulhos dos cansados e secos pivots da escora, o conjunto seguia imparável, rumo ao destino final, passados trinta minutos depois de ali chegar.


Ouro puro. Trigo ondulante ao sabor da brisa…

Hora de almoço, a fritar da cabeça…

Depois de mais umas curvinhas aqui e ali, depois de mais uns bosques de pinhal ajudando ao caminho com as suas sombras e por uns velozes caminhos de terra vermelha chegamos rapidamente á zona que para mim se mostrou como o ex-líbris de toda a aventura. Os trilhos que levam até à praia do Castelejo foram alucinantes. Assim que lhes deitei o olho foi algo que me deixou verdadeiramente extasiado. Qualquer coisa de brutal, com uma paisagem brutal, ficou sem margem para enganos como um dos meus melhores momentos em cima da minha btt.
Descer aquele “single” até lá abaixo foi um luxo e uma maluqueira que não resisti. Não me iria perdoar se viesse de tão longe para ali deixar a marca da sola dos meus sapatos ao invés da trilha dos meus pneus.
No entanto, os metros inicias da primeira descida tiveram que ser superados desse modo, já que a inclinação lateral do trilho não me deixava manter a traseira no sitio, estando constantemente a escorregar no xisto que se desfazia debaixo dos pneus, quando tocava nos travões…

A vista, essa, era absolutamente fantástica, alucinante…
O cenário ideal.


Praia da Cordoama...

Um luxo de trilhos, preciosos…

Piso instável e imprevisível…

Uma delícia…

A subida que se seguiu foi a ultima da jornada. Em óptimo asfalto, serpenteando encosta acima, fazendo com que os músculos entrassem de novo numa cadência suave, ritmada e tranquila. O corpo parecia que só sabia andar de bicicleta, fazia-o sem esforço, sem acusar demasiado o cansaço de todos os quilómetros e desnível acumulados, reagia de bom agrado a mudanças de velocidade inclusive. O ananás há muito que tinha encontrado a sua posição em cima do rijo selim e só se queixava nas maiores porradas, andando anestesiado a maior parte das tiradas.
Não tinha acusado ainda uma única cãibra, longe disso. O meu joelho estava em perfeitas condições e todas as dores que tinha tido até ali resumiam-se mesmo ao dorido traseiro.

Cheirava a conquista no ar como cheira o perfume de quem se ama. Entrava-me pelas narinas, carregava-me os pulmões e queimava. O oxigénio que inspirava parecia não chegar para saciar a sede que tinha de ver Sagres, enquanto a subida que tinha pela frente parecia não ter fim.
A pequena placa não deixara margem para equívocos. 10%! Acusava a dita.
E assim fui, inicialmente pujante para terminar espremendo por completo a avozinha, mas subindo metro após metro até entrar de novo nos estradões de pinhal para depois, ao largar a linha de eólicas, avistar à esquerda perdida ainda ao longe a tão ansiada vila.

Sagres estava ali, ao virar da esquina.
Já lá estava, quase que lhe tocava. Tinha conseguido e estava finalmente a chegar ao destino, com quatro dias de pó, suor e muitas aventuras pelo caminho!


Sagres ao virar da esquina…

Praia do Beliche…

Mais estradões cheios de pedra, que ignoro totalmente com o rabo e “pivots” a gritar de dor, até que chego à praia do Beliche, local onde apanho a ciclovia do Algarve. Aqui ia já num estado de ânimo que não saberia bem identificar, mesmo que quisesse. Um misto de sensações e emoções me passavam já pelos meandros da memória ainda nem tinha terminado, lembranças de situações assaltavam-me, fazendo-me sentir algo nostálgico já, uma mescla de experiencias sensitivas que varreu todo o espectro da escala…

Estava a terminar uma das viagens que mais prazer me tinha dado realizar. Foi talvez uma das sensações para a qual estava menos preparado. Muito menos do que para a dureza do percurso.

Fui desperto destes pensamentos quando avistei a Fortaleza de Sagres. Sabia que a praia da Mareta ficava já ali ao lado e na realidade, em pouco menos de cinco minutos andava por cima das areias da praia dourada praia, banhada por águas tão límpidas que parecem artificiais, palco de outras tantas aventuras mais mediáticas, mas que agora assistia, silenciosa, à minha vitória pessoal.

Ao meu pedido de “foto, please” o casal inglês, já velhote, atendeu sem cerimónias e foi só depois desta pequena tarefa cumprida que me larguei a navegar por aquele mar afora, em pensamentos claro!


Fortaleza de Sagres, no final da jornada…

Fim da linha. Na base da falésia descansam as areias da Mareta…

Destino à vista, 300kms depois…

A fotografia da praxe…

Depois de uns largos minutos passados a descansar na praia acabo por regressar ao largo da Praça da República onde tinha combinado com a Rita pelas 16h00. Pouco passava das 14h00 quando aqui cheguei e depois do tempo gasto em “contemplação” à beira-mar fui procurar algum sítio para comer, pois estava com uma fome de gigante.
Dou-lhe uma apitadela. Estava a vinte minutos dali. Ligo também para casa dos meus pais a relatar o sucesso da jornada!

O hambúrguer ainda não tinha pousado na mesa já a Catita tinha chegado, acabando por me fazer companhia nesta minha humilde comemoração de vitória… Uma refeição decente com um brinde no final. Ouro sobre azul!

Ainda antes de levantarmos ferro rumo a casa, revejo Irún, que aparentemente seguiu o meu conselho de visitar Sagres, embora aqui pouco tenhamos falado. Já tinha falado nele à Rita, porque ela estava comigo quando o vimos na Costa, mas ele não se mostrou muito à vontade e foram rápidas as despedidas…

Como epílogo desta brincadeira posso apenas dizer que guardo o tesouro mais importante que posso.
As memórias das experiências e das sensações durante estes dias de privação mas de supremo prazer. Guardo também a vontade que tenho já de repetir a brincadeira, desta feita com amigos para desfrutar de uma outra forma da experiência…
Para partilhar algo que senti como sendo fantástico, digno de ser realizado, de ser aproveitado, uma vez que está aí, desejoso de se mostrar, disponível para contemplar os mais ousados dos viajantes com algo que jamais esquecerão.

Resumo da etapa
Hora saída: 08H00
Distancia: 64.1km
Tempo total: 06H38
Tempo movimento: 05H10
Velocidade media: 12.4km/h
Velocidade máxima: 37.5km/h
Acumulado de subidas: 1060m
Acumulado de descidas: 1191m



(FIM)

sábado, 16 de maio de 2009

"Travessia do Sul" - Dia 3

" Travessia do Sul "
Um aventura em solitário por trilhos e caminhos do sul de Portugal.

16 De Maio 2009
Cabeço da Eira – Aljezur


Ainda antes de adormecer na noite anterior tinha procurado no GPS por algum POI que me permitisse uma noite diferente das que estava a fazer. Não era tanto pelo chão da dormida ser sempre duro, mas sim por um banhinho em condições que já apetecia, e de que maneira devo dizer. Até o meu próprio cheiro já me incomodava e não fossem os toalhetes de bebé já há muito que me tinha jogado a um qualquer charco do caminho…
Ansiando por algo que me permita as comodidades suficientes para um banho daqueles, dedico 2 minutos a vasculhar nos POI’s do GPS e não é que encontro o Camping do Serrão, apenas a 2.5km dali…

Ainda pensei em desmontar tudo, arrumar de novo, fazer-me ao caminho e tentar encontrar o tal parque de campismo. Mas outras questões rapidamente se levantaram: Estaria aberto? Ainda existiria e caso sim, estariam a aceitar entradas àquela hora? Teria restaurante?!
Ainda me lembro vagamente de pensar que já não valia o esforço de sair do conforto das plumas do saco-cama…

Acordei completamente revigorado pelas 09h30 da manhã, mas fui-me deixando rezingar na preguiça de uma manha de Maio, tranquila e quente. Apetitosa.
Enquanto ia fervendo água para o 1º pequeno-almoço, que seria mais um par de mini-chocolates e uma caneca de chá do tamanho dos Himalayas, ia pensando no que fazer da etapa do dia.
Tinha inclusive posto a hipótese de arrancar já hoje para Sagres, mas isso iria modificar os planos que tinha traçado para ter boleia para casa desde o final da jornada, onde a Catita me iria buscar no Domingo.


Ainda a rezingar dentro do saco-cama…

A ideia base ficou por isso como sendo chegar até ao final da etapa que deixara incompleta na tirada anterior, almoçar qualquer coisa e procurar alojamento. Antes ainda passaria no Rogil para o 2º pequeno-almoço que entretanto começara já a arranjar lugar no estômago e seguidamente iria à descoberta do tal parque de campismo, que a existir seria a noite de hoje, com todas as comodidades que desejava.
E parecendo de propósito, o sítio do parque estava situado a 300m do trilho que seguia e depois de marcado o desvio arranco, finalmente, para mais uma jornada quando a manha passava já das onze horas…


Inicio do 3º dia…

Primavera em estado bruto…

“Turismo pois então, que há muito tempo não passeio por Aljezur…” - Era nisto que pensava enquanto dava as primeiras pedaladas.
O dia, à semelhança dos anteriores estava perfeito. O calor que já se fazia sentir era constantemente dissipado por uma brisa dócil, mansa e primaveril…

É-me difícil resistir aos encantos da natureza. Seja ela onde for. É-me quase impossível não deixar que essas paisagens e sensações me absorvam por completo, inteiro, e é assim perdido no mundo que chego, num tirinho, ao Rogil…


Olá Sr. Burro, como está?

E as meninas? Como têm passado?

Não me ligaram pevide! Pudera, era hora do pequeno-almoço…

Assim como contava, foi num dos cafés da vila que tomei o verdadeiro pequeno-almoço. Uma empada ainda quente, mais uma sandes de queijo, outro pastel de nata queimadinho com canela a gosto para rematar, café e cigarrito no final descansado na esplanada do lugar.

“Que puto luxo! Ainda saio daqui mais gordo” – Lembro-me de pensar enquanto a senhora continuava a encher o mostrador de bolos e outras delícias que me faziam brilhar os olhos, como criança numa loja de gomas.


Na “esplanade” do café no Rogil a ver passar o movimento…

Aqui vejo de relance passar um ciclista com a bicicleta completamente atafulhada de carga. Era atrás, era à frente, era em cima, era às costas, eu sei lá. No entanto a cena mostrou-se-me familiar, fiquei com a impressão que já tinha visto aquela figurinha antes, mas custava-me a crer…

Como já estava só na fase de contemplação do movimento da rua e do próprio café onde me encontrava, tomei a rápida decisão de ir ver se quem me parecia assim o era realmente. Volto a aprumar algumas coisas dentro dos alforges e continuo o meu caminho, sem me aperceber que de alguma maneira deixava aqui o meu pequeno tripé da máquina fotográfica e que me vinha a permitir fazer alguns retratos – só viria a dar pela sua falta já em Aljezur no final da tarde…

Não percebi isso, nem percebi o ciclista parado na berma da estrada a entrar para um café de garrafa de água na mão. Ou melhor percebi, mas outra vez de relance, embora desta vez tenha dado para um aceno solidário e para ficar com a certeza de que, sim senhor, era o moço que tinha visto na ciclovia da Costa da Caparica na terça-feira passada enquanto passeava por aquela zona e que me tinha chamado a atenção devido à enorme carga que transportava aliado ao facto de também eu estar a preparar a minha partida que me trazia aqui hoje…

Não parei. Segui pensando na aventura daquele puto – porque era mesmo um puto – mas rapidamente me perco desses pensamentos quando surge visível na curva da estrada a placa informativa do parque de campismo que procurava. Bem dita! Pelo ar novo desta o sítio parecia estar operacional e a ideia de banhos e jantar começava a formar-se já bem palpável e real debaixo da monha empoeirada carapinha.


Olha que coisa fixe, afinal existe...

O desvio que seria obrigado a fazer era apenas mais à frente, coisa que demorou uns dois minutos a surgir, assim como o camping, que se encontrava realmente aberto e com restaurante a funcionar em pleno, além de possuir lavabos “à séria”.
Na recepção soube também que o parque estava aberto até às 22h00 e que aceitavam entradas inclusive até essa hora, assim como o restaurante só fechava às 23h00.
Claro que fiquei logo a moer o facto de ontem não me ter lembrado de vasculhar os POI’s do GPS à procura de algo semelhante mais cedo, mas já nada podia fazer a não ser aproveitar porque, agora sim, já ali estava.

Ficou por isso resolvida a dormida e o jantar de uma virada só.
O arranque da jornada final contaria com estes poucos quilómetros a mais, mas que não faziam diferença alguma já que sendo sempre a descer, até serviam como aquecimento antes de iniciar a dura subida ao castelo de Aljezur, com a qual iria iniciar o ultimo dia de hostilidades.

Sinceramente pensei ainda em deixar montada a tenda, largar alforges e peso e ir, desta forma, rever Aljezur levezinho.
Mas resisti à tentação e depois de meia volta e retomar o track original, segui direito à povoação carregado como havia chegado até ali. A etapa já iria ser frouxa, não haveria de afrouxar mais ainda!
Era uma questão de orgulho pessoal que estava em jogo…

A chegada à povoação de Aljezur foi feita pela sua entrada norte, começando logo aí a subir. Esta é uma vila antiga, mas que se mantém cuidada e hospitaleira. De ruas empinadas e becos apertados, degraus acatitados em cotovelos sujeitados por entre muros pintados de cal, muito brancos, que queimam a vista ao mais incauto dos visitantes…

Considerei um pequeno luxo pedalar por entre o casario, longe das gastas passagens dos turistas de verão. Passar ao lado do olhar incrédulo da velhota que não acredita eu vou por ali de bicicleta e que me grita:

“Oh menino! Olhe que por aí são as escadas…”
“Ah obrigado, mas não faz mal. Eu cá me arranjo.”
– Respondo antes de olhar as escadas e de me ver obrigado a concentrar todos os sentidos numa só acção. Não cair!


Todas as vilas portuguesas devem ter um Largo do Pelourinho…

Recantos de Aljezur…

A igreja de Aljezur estava no caminho para o castelo. Passaria lá amanha pela fresca...

Mais um recanto de Aljezur… Ali mais à frente apanhei as tais escadas malucas…

Os museus por aqui estão todos muito bem tratados…

Mais recantos empinados de Aljezur. Aqui já só passam os da terra…

Junto ao rio, na zona baixa da vila…

Já junto ao rio foi onde acabei por parar e com agradável surpresa vejo novamente, encostado debaixo de uma grande sombra, junto à ponte, o meu amigo viajante do Rogil.
Aqui parei quase de imediato, até porque a hora do almoço ia correndo solta no dia, e depois de dois dedos de conversa fiquei a saber que se chamava Irún, de origem Belga. Andava de visita ao nosso país, dormindo em Pousadas da Juventude, onde as havia.
Ficámos um bocado à conversa, daquelas da treta, mas que sabem como mel. Acabei por ainda lhe dar algumas informações acerca do que lhe faltava percorrer, algumas recomendações sobre trajectos ou sítios que poderia gostar de visitar… Estava a chegar a uma zona que não sabia bem por que hipótese optar. Pretendia seguir para Faro e depois subir direito a Beja e daí sempre para norte, com desvio e passagem pelo OPorto, como lhe chamava…
Foi com o Irún que fiquei também conhecedor da existência de uma Pousada da Juventude na Arrifana, coisa que desconhecia completamente…
Uma coisa que lhe parecia fazer confusão era a nossa condução nas estradas e a falta de condições para ciclistas. Não entrava em ruas de sentido proibido porque dizia não ver a placa de “excepto bicicletas” como na terra dele. Não sabia se era obrigado ou não a andar de capacete e se podia circular nas estradas normalmente porque em nenhuma viu sinalética referente a bikes…
Acabei por ter que lhe explicar que sempre estava em Portugal e que, envergonhadamente, ainda estamos a dar os primeiros passos em relação às bicicletas na vida diária dos portugueses…

Acabei por lhe dizer, antes de nos separarmos, que poderia também querer visitar Sagres e daí seguir pela costa até Faro e depois então manter o seu plano inicial…ao qual respondeu com um murmúrio que já não consegui traduzir.
Um adeus e lá foi ele à procura da dita pousada enquanto eu pedalei direito à Aldeia Nova, povoação irmã de Aljezur, sobranceira a esta pelo lado de nascente.

Acabou por ser o palco do meu almoço o largo da igreja, junto ao café Colmeia, com um grupo daqueles sexagenários hippies que se vão encontrando nos Algarves e que por aqui se vão perdendo no tempo. Malta porreira e entre inglês, alemão, alentejano e português lá nos fomos entendendo o suficiente para nos rirmos e todos passarmos um bom bocadinho já que eles faziam musica e ritmos com as coisas que tinham à mão, tipo aquela banda britânica muito famosa, e eram bastante comunicativos e divertidos.


Auto-retrato já com a máquina em cima de um banco do jardim em Aljezur…

Aldeia Nova onde acabei por almoçar…

Foi muito bom! O meu almoço foi à sombra de um grande chapéu, com uma companhia divertida e alegre, uma enorme sandes de carne assada, acompanhada de salada e mais uma Coca-Cola.
Naquela mesa, todos eles eram “da terra”. Os que lá haviam nascido e os que por lá haviam escolhido morar, coisa que aliás transparecia bem na pele já castanha, outrora branca, enrugada e queimada pelo sol deste nosso tão hospitaleiro cantinho, da malta que acusava a nascença noutras paragens mais frias desta Europa.


Ao lado do café Colmeia…

Igreja de Aldeia Nova…

Labuta dos campos de forma tradicional ainda em vigor por estas bandas…

Ainda dou mais uma voltinha por Aljezur, que de plana só tem mesmo a zona do rio. Toda a povoação se desenvolve na encosta do monte originando sempre bastantes subidas, normalmente empedrado mas em bastante bom estado.

Volto a encostar numa das esplanadas, com uma vista magnifica, desta vez para me demorar numa leitura que vinha mantendo à noite, que me estava a interessar e assim mais duas horas fugiram voando ao sabor dos sonhos e quando me propus regressar de novo ao parque de campismo eram perto das 17h00.
Calmamente percorri aqueles metros já conhecidos e que me levariam à última subida do dia, longa, que duraria 2.5km, mas que tinha que vencer obrigatoriamente.
Fui pedalando tranquilo enquanto pensava já na água a bater-me na cara no duche e no jantar, que seria de rei, e pelo qual estava disposto a pagar o que me pedissem e, acima de tudo em como seria a ultima noite antes das areias da praia da Mareta, o meu destino final. Pensava em como estava quase lá…

Mas a penosa subida haveria de me obrigar a algum puxa/empurra porque devido a uma condução menos atenta deixei a direcção fugir e… ao mesmo tempo que forço a pedalada para corrigir a desatenção, a frente levanta-se sem mais avisos e quase me senta no chão de tão distraído que vinha.
Arfando feito parvo e de coração aos pulos fico a olhar o que restava da subida…


O que faltava subir…

Com Aljezur a ficar lá em baixo…

As boas vindas…

O parque com espaço de sobra…

A minha menina livre do peso…

O suporte que era alvo de atenta inspecção todas as noites…

Preparada para mais uma noite, a ultima…

Enquanto montava e aprontava o estaminé chegou às minhas vizinhanças um outro ciclista, também sozinho, ainda com mais carga que o Irún.
Quando ele começou a montar o seu espaço percebi porque. Desde tenda daquelas antigas, como aliás também tive, em triângulo e mais rudimentar ainda que o sistema de luz que trazia montado na bicla, daqueles de bobine antigos que encostavam no pneu e assim davam uma luz fraquíssima.
Montou inclusive estendal. Parecia ele que estava ali para ficar 15 dias… Estaria?!

De qualquer forma perdi-me um pouco a mirar aquela lição de vida, mas sem nunca me fazer notado. O senhor apresentava ter mais idade que o meu pai, cabelo totalmente branco, franzino, mas claramente habituado àquela rotina. Quantas aventuras não lhe pesariam já na agastada mochila? Quantos quilómetros de liberdade não trariam já aquelas pernas pedalados?

Tudo perguntas que ficaram sem resposta, entre outras, obviamente…
Fui desperto desta nostalgia por um ronco na barriga que se deve ter ouvido na recepção do parque. Até fiquei embaraçado, embora nas imediações não houvesse agora vivalma.

Peguei na carteira e no telemóvel e fui direito ao restaurante, comer por hoje e por amanha que bem iria precisar.

Foi o melhor que podia ter feito. Num espaço com um aquário gigante, como nunca tinha visto, repleto de peixes tropicais de todas as cores e feitios, bem tratado com visível dedicação comi como um guerreiro depois da batalha. Um enorme bife da vazia grelhadinho com molho de natas e lima acompanhado de muita salada e um geladinho para sobremesa. A bebida, claro, uma cola fresquinha e mais meio litro de água que acabei junto com um café.
Divinal! Sentia o organismo a absorver lentamente todo o combustível que lhe ia dando, até ficar saciado por completo.

Mesmo sabendo que o dia de hoje não tinha sido de forma alguma cansativo, de energias renovadas sentia-me melhor ainda, com o entusiasmo e força nas pernas suficientes para encarar o dia de amanha, durante a curta caminhada de volta à tenda, como quase garantido. Não sou de deitar foguetes antes da festa, mas tinha as expectativas bem altas…

Depois dos telefonemas da praxe para casa, de mais um pouco do “Apelo da Selva” que me agarrava à leitura como já o havia feito outrora, muitos anos antes.
Acabo por me render ao sono e ao pesar das pálpebras pelo que me deixo adormecer tranquilo com o despertador afinado para as 06h30 da matina, para a ultima e mais ansiada jornada deste passeio. Afinal sempre iria conhecer “in loco” os trilhos da praia do Amado, Castelejo e outras pérolas que tais…

Jóias essas que se encontravam agora a poucas horas de distância…

Resumo da etapa:
Hora saída: 11H30
Distancia: 21.5km
Tempo total: 04H56
Tempo movimento: 01H55
Velocidade media: 11.2km/h
Velocidade máxima: 32.1km/h
Acumulado de subidas: 317m
Acumulado de descidas: 333m



(Continua...)