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segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Ice Climbing II – The Day After

Acordei com o relógio a marcar as 04h00 da manhã!
Entre dois bocejos visto as calças de primeira camada e as impermeáveis logo de seguida. De relance reparo no pequeno pormenor de levar calçados dois pés esquerdos! Passo a explicar. Duas meias esquerdas para ser mais preciso. Demasiado ensonado para me entregar numa procura pelo par certo da meia errada, deixo os pés acomodados e quentes tal como estão e num ápice os afundo dentro dos ténis.
Enfio uma fatia de bolo na boca ao mesmo tempo que o chá ferve e salta para o cantil, enquanto a Kira me olha ensonada sentada ao balcão de algum modo já habituada a estas minhas fugas furtivas…
O meu pai e o Pedro esperavam por mim no Cacém e o Luis e o Ricardo por nós nas Mercês às 05h30.
A viagem correu sem incidentes e foi na companhia de um bonito céu azul que chegámos à Covilhã. A subida até à Torre fez-se devagar apreciando a paisagem e o lindo dia que nos aguardava! Um pouco de nevoeiro matinal cobria ainda o planalto da serra quando estacionámos a Kangoo do Luis.
Devido à proximidade do acesso, encontrar o sector de escalada em gelo conhecido como as Couves, foi fácil e rápido, permitindo começar a escalar muito depressa e aproveitar em grande um belo dia na montanha em excelente companhia.


Ricardo a caminho do inicio do Corredor Estreito e das Cascatas…
Eu, o Pedro e o Luis na base das cascatas…

Eu e o Luis momentos antes da sua escalada. Foto de: António Nunes
Luis dá segurança enquanto o Ricardo resolve os últimos metros desta bela cascata…
O Sol ia descobrindo e marcando presença, permitindo-nos desfrutar de magnificas vistas sobre o Covão Cimeiro e restantes paredes rochosas e corredores gelados que se afundavam no vale que se perdia por debaixo da nossa linha de horizonte. Conseguíamos ver inclusive as cascatas das nossas escaladas da semana anterior, centenas de metros lá em baixo, pequeninas…
As escaladas começaram em grande com o Luis a ganhar nova confiança e a abrir a primeira via do dia, ou pelo menos a sua maior parte e a mais complicada, ficando a restar uns quantos metros até final e que foram resolvidos pelo Ricardo também ele em grande forma mental e a lidar muito bem com a qualidade do gelo daquela bela manhã…


Eu durante a abertura da segunda cascata do dia, com o Pedro a dar-me segurança… Foto de: António Nunes
A segunda via do dia estava destinada a ser aberta por mim. Uma linha recta, perfeita, a terminar num triangulo de gelo sólido e brilhante. Curta, quase vertical mas muito, muito bonita!
Com o Pedro a dar-me segurança vou subindo devagar, ganhando confiança e depois de três parafusos de gelo colocados, algum medo passado devido algumas surpresas na qualidade do gelo e um topo com mais dois parafusos com as distâncias recomendadas e como manda a sapatilha para finalizar aquela que foi a minha primeira via de escalada em gelo aberta na integra desde baixo. Excelente!
Foi mesmo perfeita! Mais que não seja porque foi a "minha" linha, a redenção e o prazer sublime. Tudo reunido no topo desses mais ou menos dez metros de gelo quase vertical, nao contando com as centenas que se estendem como vazio até ao vale perdido na imensidão branca bem lá em baixo.
O prazer destas pequenas conquistas é como droga. Fugaz, mas incrivelmente viciante!



Aceitar o compromisso para desfrutar do prémio… Foto de: António Nunes
Eu preparo a minha primeira repetição da via enquanto o Ricardo se prepara para me dar segurança…
O meu pai na sua primeira escalada do dia…

O dia ia correndo solto como os metros de corda corriam dentro dos mosquetões. Com os topos das vias montados as repetições foram-se fazendo com o meu pai e o Pedro a escalarem bastante assim como eu, o Luis e o Ricardo.
Fomos visitados por vários companheiros destas lides da montanha. Primeiro por um solitário jovem que subia desde a base do Cãntaro Magro, de sotaque nortenho bem vincado, extremamente simpático e de sorriso simples e aberto.
Conversa para aqui, conversa para ali e em menos de nada está já a escalar também, depois de ter aceite o convite do Luis a um tirinho numa das vias montadas…
Mais tarde surge um outro grupo de 3 rapazes que desceram pelo mesmo caminho que nós fizemos e que vinham deitar uma vista de olhos ao sector onde estávamos. Ora mais um bocadinho de conversa e depressa também eles se penduraram nas nossas cordas para fazerem o gostinho ao dedo e escalar um pouco em gelo.
Ficaram apenas pela via aberta por mim e acho que não chegaram a fazer nenhuma outra.



Ricardo em primeiro plano enquanto atras dele escala um dos nossos visitantes…
Pedro na sua segunda escalada do dia…
Durante estas brincadeiras houve ainda tempo para assistirmos à queda da minha mochila, pendente abaixo, depois de ter sido atingida em cheio por um pedaço de gelo que caiu da parede.
É normal que a parede de gelo vá largando pedaços, soltos ora pelos piolets ora pela má coesão e fusão do proprio gelo que estala, racha e quebra. Alguns são pequeninos, mas de vez em quando lá vem um maior que requer muita atenção à sua trajectória.
A minha mochila devia estar distraída e não viu o bloco que lhe acertou em cheio fazendo com que esta se precipitasse no abismo rolando descontroladamente, até que por um acaso de sorte rebola para um pico de neve encaixado entre dois corredores mais pequenos e pára! Precisamente o único sitio onde poderia parar. A não ser ali e iria encontrar a mochila algures na base deste comprido corredor.
Provávelmente foi onde o meu cantil acabou a sua viagem. No momento em que esta se está a imobilizar escorrega de dentro da mochila aberta o meu cantil térmico cheio de chá, de certo ainda quente mas que nem cheguei a provar sequer. A bem dizer, nem provei o chá nem o cantil era meu. Era do meu pai e estava emprestado aqui ao Je, e pesando o facto de já nao vedar bem, nao deixava de ser um bom termo!
Aquilo de ver a mochila aos trambolhões deu-me um arrepio na espinha. Entre outras coisas, dentro da mesma ia o meu GPS, máquina fotográfica e de filmar, frontal, etc. Foi uma sorte só ter perdido o cantil!
Como estava a dar segurança ao Pedro, o meu pai desceu para recuperar a mochila mais o Luis.
Depois daqueles segundos de suspense acabou por ser um momento divertido…
Por volta das 16h30 acabámos as nossas brincadeiras e rumámos aos carros. 


Pedro sobe a pendente nevada de encontro ao meu pai enquanto eu e o Ricardo preparamos a desmontagem da via…

Depois das armas e bagagens arrumadas, a paragem já costumeira para o lanche com uma grande sandes de queijo da serra fez-se novamente nas Penhas da Saúde e dali até Lisboa foi mais uma viagem sem precalços, cumprindo apenas as necessárias paragens técnicas e pelas 20h30 estávamos de novo em casa!
Mais um sábado em grande!
Um início de época que promete!

Os links para as fotos estão aqui:
Fotografias de António Nunes
Ice Climbing II – Serra da Estrela

O Filminho que foi feito já está pronto! Tem 30 minutos de duração em qualidade DV.

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