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terça-feira, 25 de agosto de 2015

Via Algarviana - Dia III

Via Algarviana em BTT / Salir - Silves
Etapa 3 - 25 Agosto 2015

Sentia-me em casa, literalmente!
Sentia-me assim durante as primeiras pedaladas como me senti ao chegar na tarde anterior ao pequeno povoado de Salir.



Conheço relativamente bem esta zona, a zona da Rocha da Pena, devido às muitas viagens que aqui fiz para escalar, mais no passado, mais ainda assim muitas memórias, todas felizes, me assaltam a cabeça durante as primeiras pedaladas desta bela manhã.
O maciço imponente da Rocha da Pena vai-se mostrando com os seus tons vermelhos enquanto os primeiros raios de sol, já quentes, lhe acariciam as paredes calcárias! Como conheço aquela mole de pedra, aqueles recantos da sua falésia e muitas das suas sombras, os caminhos que até elas sobem e o café que lhes fica perto...

Mas hoje, já o tinha visto no mapa, iríamos subir o monte em frente. Oposto a Sul e terrivelmente empinado. O piso que teríamos pela frente e o tipo de caminhos que iríamos apanhar já eu fazia ideia de como seriam pelo que, ainda durante o jantar da noite anterior, tinha decidido que, se todos os factores se conjugassem na dureza e na adversidade, eu iria fazer a primeira grande subida do dia, que teria inicio ao km 7, a pé!
E assim foi!




Mas até lá foi um prazer. Caminhos ladeados por muros de pedra, antigos, com passagem por pequeninos aglomerados de casas brancas e muitos campos de cultivo, sempre em bosque, sempre à sombra, protegidos do calor matutino que já se fazia sentir.

Após a grande subida, mantemo-nos em cumeada durante alguns quilómetros, por trilhos técnicos com muita pedra, de um vermelho intenso e repletos de cheiros e barulhos. Estamos em plena paisagem natural protegida da Rocha da Pena.

Após a povoação de Benafim tivemos ainda direito a uma grande subida que vencemos sem pressas. Dura nas inclinações de algumas zonas, manteve um piso macio e em bom estado, permitindo pisar forte nos pedais e ultrapassá-la sem recorrer ao pedestrianismo.

Para mim, a melhor parte de todo o percurso do dia de hoje. Trilhos e caminhos ao meu gosto, técnicos e exigentes, com uma paisagem de tirar a respiração, que nos transportam até à zona de Fontes Grandes e Pequena, na ribeira de Alte a escassos metros de entrarmos na povoação propriamente dita.
Foram umas horas de verdadeiro prazer e deleite!

Fazemos nesta zona espectacular um merecido descanso e aproveitamos para comer algo do que comprámos na mercearia em Salir. O dia estava quente e uma breve paragem já apetecia.
O local é de uma beleza ímpar e, caso não seja pela fome e pelo cansaço, é para contemplar a beleza do lugar que qualquer viajante é impelido a parar!

Nós comemos, descansamos e fotografamos como e donde podemos. Eu, pelo menos. É que pese embora já conhecesse o local, não deixo de me deslumbrar com a sua peculiaridade, tranquilidade e beleza simples, mas voltamos a parar no centro da vila de Alte, uns metros mais à frente, para obter o respectivo carimbo no Passaporte como para reabastecer de água e Eu, para um café que ainda não tinha tido oportunidade de tomar.

O centro da vila pulsava de vida, com dezenas - ou centenas mesmo - de turistas estrangeiros e nacionais embrenhados nas suas ruas estreitas, nas esplanadas dos cafés, nos quiosques de postais...
Alte cheirava a Algarve que inebriava!





A próxima povoação a passar seria São Bartolomeu de Messines mas não foi fácil para os meus companheiros lá chegar. Depois da povoação de nome Perna Seca, os estradões dão lugar aos single-tracks técnicos e exigentes, com muita pedra afiada por todo o lado, obrigando mesmo a desmontar em algumas zonas. Mais por precaução com o material e com os furos do que com a dificuldade dos mesmos.
Muito, muito bom!
Trilhos realmente divertidos e menos monótonos dos que vínhamos a apanhar até então, mas se uns (Eu) adoram, outros, como os meus dois companheiros de aventura, detestam!

Muitos metros foram percorridos a empurrar a bicicleta pelo nosso companheiro Pedro, deixando este um role de asneiras no caminho de fazer corar o mais leviano dos boémios!
Mas tudo tem um fim, e passado alguns arranhões, estávamos de novo a pisar estradão, mas a pedra essa, mantinha-se lá, debaixo das rodas, a obrigar a um pedalar atento e menos confortável. A ser o denominador comum de todos os trilhos até ali! Mas por agora, sem grandes dificuldades físicas ou técnicas a vencer. Rolámos soltinhos até ao Barranco do Vale e ribeiro do Meirinho onde percorremos mais um single-track fabuloso e muito técnico.
Mais dois ou três quilómetros e avistamos São Bartolomeu de Messines. O necessário carimbo leva-nos à Junta de Freguesia da localidade e em frente desta fizemos a necessária paragem para almoço.

Num café com sombra, almoçamos as sandes que trazíamos de Salir, às quais juntámos uns extras. No meu caso, uma coca-cola fresquinha, um gelado e um cafézinho para rematar. Junto com a conta peço uma garrafa de água de 1.5L fresca a estalar e que entra inteira para dentro dos dois cantis, já completamente vazios.

Arrancamos e passamos a linha do comboio em direcção à ribeira do Arade que apanhamos uns quilómetros mais à frente. Esta parte do percurso foi muito bonita e rolante, sempre ladeando este enorme curso de água, fazendo do dia tórrido, algo bastante mais suportável. Uma leve e fresca brisa seguia-nos ao longo de todo o vale e manteve-se até ao paredão da Barragem do Funcho.


Devido ao facto de não ter olhado para o mapa do percurso da etapa, desconhecia que a zona mais dura de toda a etapa estava depois do muro da barragem, com uma subida duríssima e muito extensa. Por desconhecimento, deixei muito pouca água de reserva no cantil que ainda mantinha algum do precioso líquido. Fui ao engano do meu companheiro Pedro que indicou a subida que tínhamos acabado de vencer até à zona de merendas no alto da Barragem do Funcho como sendo a última do dia e haveria de pagar essa desatenção a um preço exorbitante e com juros de mora!

Após a vertiginosa descida e consequente passagem pelo muro da barragem entramos num vale tão fechado que percebi, quase de imediato, que não seria possível sair dele sem subir de forma estonteante, quase a pique.
Todas as paredes dos montes que nos envolviam tinham nelas rasgadas finas tiras de caminhos que me indicavam que nada naquele vale subia àqueles montes de forma suave e tranquila.
A minha transmissão começa também ela a fazer uns barulhos de quem não queria mais, de quem estava mais para parar e descansar do que para continuar naquela tarefa de subir metros à serra.

Apanho os meus companheiros parados à sombra de um chaparro, protegidos do sol que queimava a pino. A temperatura rondava os 40º! 41º, quase 42º para ser mais preciso...
Percebo que a subida que tenho pela frente é demasiado dura para mim e desmonto.
Fiz o restante a pé, a lutar contra as inclinações de algumas das rampas e contra o calor abrasador que se fazia sentir. Restavam-me dois ou três golos de água no cantil e assaltavam-me as memórias do que tinha vivido na Grande Rota das Aldeias Históricas de Portugal, nem há dois meses atrás.




Mas devagar lá acabo por vencer aquela grande tira de poeira e pedras, que rasgava todo o monte de forma perpendicular à sua pendente, desafiando a minha sanidade mental. Devagar, evitando qualquer esforço que não fosse assumidamente necessário, resguardando o corpo dos devaneios da mente, e lá chego ao cimo, junto aos meus companheiros que me esperam.

Entre-cortadas com algumas descidas longas e extenuantes vão aparecendo mais umas quantas subidas penosas e exigentes. O piso dos estradões era agora maioritariamente de poeira fina e pedras, muitas e de vários tamanhos, escondidas debaixo dessa camada de pó fino, cor de terra, creme, e que se levanta a cada passada e que se enfia em todo o lado....

Sinceramente, muito mais que o troço de Cachopo-Barranco do Velho, este foi o pedaço de caminho que mais me custou a superar, fazendo com que chegasse a Silves completamente nas últimas.
O cansaço era visível no rosto de todos, mas eu sentia-me exausto.

Ainda assim, e talvez pela experiência acumulada nestas andanças, tive que, de alguma forma, tomar a liderança nas decisões do que fazer quando o track do dia termina abruptamente a meio quilómetro de distância da povoação de Silves, onde tínhamos marcado o nosso alojamento, literalmente no meio de "nenhures".

Acabo por arrastar os meus companheiros até à povoação com a lógica mais racional que encontrei e que resultou bem porque todos entenderam que não tínhamos outra opção e quanto mais depressa a tomássemos, mais depressa poderíamos dar por concluído o dia e largar as bicicletas num canto e descansar.
Acabámos por encontrar a Residêncial Vila Sodré num ápice, graças em parte ás minhas capacidades de navegação com GPS acumuladas ao longo dos anos, situada no extremo oposto da vila de Silves a 2kms do local onde terminava o track GPS e do local onde parámos inicialmente.

Após as coisas encostadas a um canto, literalmente, fui tratar de dar um mergulho na piscina, na esperança de que se mostrasse tão rejuvenescedor como o primeiro em Salir, mas tal não resultou como esperava. O mergulho soube bem e foi reparador, mas não o necessário, muito menos o desejado. Talvez por culpa da pouca tranquilidade do lugar por estar ocupado com putos barulhentos e mal educados e paizinhos pouco preocupados com isso, ou por pura e simplesmente estar cansado demais para lidar com essas situações mais mundanas, mas o que é facto é que além do bem que soube no momento em que entrei na água, só voltou a saber bem quando abandonei o local de volta à tranquilidade do quarto onde os meus companheiros descansavam, tranquilamente e sem gritarias (!)



Falamos com a proprietária a acordamos o pequeno-almoço para as 07h30, ainda antes de sairmos para irmos tentar jantar pouco passava das 18h.

Escusado será dizer que acabamos a repor líquidos numa tasquita local, a beber umas cervejas e a comer umas sandes de presunto e a comer uns "mendoins".

A pé, fomos ao LIDL, a 600m de distância do sitio onde estávamos, comprar viveres para o dia seguinte e no regresso jantámos num restaurante self-service que caiu que nem ginjas!
No LIDL além da comidinha do dia seguinte, que passou por presunto, queijo, atum, gomas e pão, comprámos também pensos para o Miguel tratar as feridas que os chinelos lhe fizeram nos pés.

O homem pedala perto de 200kms até ali e são os chinelos que lhe fazem bolhas (!)
Dois pensinhos, um em cada pé e está o assunto resolvido...





O dia foi terrivelmente longo e extenuante, pelo que assim que tombo na cama, chegado ao quarto, adormeço de imediato.

Resumo da Etapa:
Distância: +/- 63Kms
Subida acumulada: 1700m D+
Tempo total: +/- H
Tempo em movimento: +/- H

O track GPS pode ser conseguido no sitio oficial da Via, aqui.
As fotos deste dia podem ser vistas seguindo este link.

[Continua...]

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